A review by thebookthiefgirl
A Lebre De Olhos De Âmbar by Edmund de Waal

4.0

“Dar uma coisa a alguém é parte integrante duma história. Não é fácil a história duma herança. O que será lembrado, o que será esquecido?”

Tudo o que minimamente esteja relacionado com Viena, com a queda do Império Austro-Húngaro e a caça aos judeus após o Anchluβ da Áustria, poderá ser vagamente suspeito de despertar interesse em mim. Este livro acompanha a saga da família judaica Ephrussi, uma espécie de Rothschild, comerciantes de trigo originários da Rússia.

Edmund de Waal, o nosso autor, herda do seu tio Ignace, que acaba a sua vida em Tóquio, os netsuki. Estes pequenos objetos de âmbar, que apresentam as mais diversas formas, cabem nas palmas da mão, são objetos pequenos, ricos dos mais pequenos detalhes e sobreviventes da história mais conturbada da família Ephrussi, do alto do seu esplendor até à sua mais completa miséria.

Os objetos percorrem Paris do século XIX, nas mãos do colecionador de arte e boémio Charles Ephrussi, que serve de inspiração a Charles Swann de “Em Busca do Tempo Perdido” visto que Marcel Proust era amigo íntimo da casa. O fascínio pelo nipónico vigorava neste tempo e Charles legará estes objetos, como prenda de casamento, ao seu primo favorito em Viena, Viktor.

Emmy, a sua mulher, guarda os objetos na sua vitrina e as suas crianças, Elisabeth, Gisela e Ignace brincam muitas vezes com eles, sob a voz de contadora de histórias de Emmy e o olhar cuidado da criada Anna.

Este livro viaja pelas ruas de Viena, aquando da formação do Ringstrasse, cuja arquitetura nem o próprio Adolf Hitler se tornou indiferente, pela presença da águia imperial dos Hofsburg, a música de Strauss, a arte secessionista de Schiele e Gustav Klimt, pelas discussões culturais no Café Central. O palais Ephrussi situa-se na Schottengasse, não muito longe do sítio onde Sigmeund Freud viveu ( um dos sítios que mais gostei de visitar ). A família possui um Banco, que é mencionada em “Marcha de Radetzky” de Joseph Roth (leiam o livro, por favor). É admirável como os Ephrussi se imiscuíram na literatura, revelando o seu impacto e denotando muito mais a sua queda.

Como judeus, ainda para mais contendo primos de diversas nacionalidades, desde francesas, russas a alemãs, em pleno conflito mundial, os Ephrussi viram-se apertados, perseguidos e cada vez reduzidos à mais abjeta condição. Elisabeth Ephrussi, a avó do autor, correspondente do poeta Rilke, foi uma das primeiras mulheres a completar a sua educação na Universidade de Viena e das primeiras a fugir ao jugo do nazismo na Áustria. O seu irmão, Ignace, que viveu no Japão, seria o herdeiro dos netsuki que escapou à pilhagem nazista, graças à criada Anna.

Edmund viria a ser o último herdeiro dos netsuki. Objetos tão pequenos que atravessaram séculos, histórias de guerra e paz, amor e perda, para voltar à sua mais remota origem. A procura de um legado, de um fio condutor que traz a vida dos nossos antepassados.