A review by katya_m
A Casa Assombrada e Outros Contos by Miguel Serras Pereira, Virginia Woolf

<i>Se quiséssemos um termo de comparação para a vida, o melhor seria o de um metropolitano, atravessando o túnel a cinquenta milhas à hora e deixando-nos do outro lado sem um gancho sequer no cabelo! Cuspidos aos pés de Deus, inteiramente nus!</i>

Virginia Woolf foi relevante para a sua (e nossa) época, mas, arrisco dizer, será ainda mais relevante com o passar do tempo, pois o seu olhar não abarcava apenas o que via, queria ir mais longe e, fazendo-o, demarcava-se do palpável, do real e chegava a um estado quase quântico da literatura. Por isso, Woolf não obedecia a regras - estruturalistas, éticas ou outras - e estava simultaneamente aqui e agora, e ali e depois. Sem barreiras, recreava os espaços intelectuais das mulheres (que, forçadas ao exílio do mundo dos homens sempre se criaram universos alternativos), falava para ontem, hoje e amanhã. Woolf criava espaços simultâneos onde se desdobram as múltiplas possibilidades da existência - uma espécie de paradoxo de Schrödinger aplicado à existência da Mulher. E mesmo sem se explanar por centenas de páginas, mesmo sem fazer uso de uma corrente de pensamento (corrente de consciência, fluxo de consciência, como preferirem - corrente de pensamento engloba também uma nova filosofia), a autora revela em três e quatro páginas uma capacidade de análise do subconsciente, do feminismo e das maquinações sociais construtivistas como nenhum outro seu contemporâneo.

<i>(...)o ponto de vista masculino que governa as nossas vidas, que fixa as regras de comportamento,(.)uma velha metade de fantasma(.)que, em breve, espero, será posta no caixote do lixo, que é o fim dos fantasmas, dos armários de mogno(.)dos Deuses e Demónios e o mais que se sabe, deixando-nos por fim uma impressão tóxica de liberdade ilícita - se é que tal coisa existe, a liberdade...</i>

A MARCA NA PAREDE
⭐⭐⭐⭐⭐
A CASA ASSOMBRADA 
⭐⭐⭐
SEGUNDA OU TERÇA FEIRA 
⭐⭐⭐
LAPPIN E LAPPINOVA
⭐⭐⭐
A DUQUESA E O JOALHEIRO 
⭐⭐⭐⭐
O LEGADO 
⭐⭐⭐⭐⭐
RESUMO 
⭐⭐⭐

E como isto vai curtinho, um pequenino aparte: os contos (e a obra) de Woolf dispensavam completamente o posfácio do editor. É certo que vender 80 páginas por 14 ou 15€ é um roubo, e tirar-lhe esta meia dúzia de folhas só o tornava mais sórdido, mas o que acrescentam as palavras generalistas e a dezena e meia de citações (sem fonte) com que Francisco Vale demostra que leu a autora? Não vejo em que medida arrogar esse feito à laia de demonstração gratuita engrandece uma escritora que não precisa de contextos - ou ajuda sequer o leitor mais leigo. Se o senhor editor, em vez de se pôr a dizer o que já todos sabemos, tivesse recuperado o último conto que constava da edição anterior, teria feito melhor figura.