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A review by rolandosmedeiros
A Pail of Air by Fritz Leiber
3.0
Um Balde de Ar
25pp
O título me pegou, não nego. Por isso parei para ler mesmo conhecendo pouco do Leiber. Nunca tinha lido nada dele e só o conhecia por meio de citações sobre a importância dele nos tropos de fantasia e por ter batizado o gênero Sword & Sorcery. Não sabia que ele também escrevia ficção científica, e nem que fosse logo ficção científica dura.
O preâmbulo meio longo é válido porque acho que essas duas facetas quase opostas (a densidade do hard sci-fi e as vibrantes histórias de aventura e feitiçaria) estão levemente presentes aqui. E o maior problema não vem da tentativa de conciliar isso, mas sim da forma frouxa que ele dá ao conto.
Antes de chegar aí, porém, ele consegue te segurar na narrativa, sabe contá-la muito bem. A abertura é forte, ao molde daquela famosa historinha "Não há ninguém no mundo. Batem a porta" só que expandida. Começa em primeira pessoa e a exposição acontece aos poucos:
Algum corpo estranho gigantesco passou pelo nosso sistema solar e arrastou a terra para longe do sol (The Big Jerk, chamam), o que faz a atmosfera congelar instantaneamente. Se entendi bem: os diferentes compostos, por conta das diferenças na constituição, congelam de maneira diversa e em camadas diferentes. O pai do protagonista consegue montar um ninho, que é como chamam o buraco de poucos metros quadrados, chapado por paredes grossas e alumínio e outras coisas, onde conseguem sobreviver buscando na parte de cima baldes de oxigênio congelado. Daí o título, sim.
Vestem uma roupa de astronauta improvisada, vão à superfície, buscam o oxigênio congelado, colocam-no perto da fogueira para derreter, e por conta da parede e outras coisas, o oxigênio é retido ali o máximo possível. Antes do balde descongelar, busca-se outro, e assim vão vivendo.
Falando assim parece tedioso, mas não é. Um mundo congelado é um mundo morto, parado, estático? Na visão do autor, não. Justamente por conta da composição de tudo que nos cerca. A dose ação/descrição/construção de mundo é bem administrada, e o ponto de vista do protagonista, quase uma adolescente, é leve e fácil de acompanhar, apesar do conteúdo. É ele quem vai nos contando tudo daquele mundo, afinal já nasceu naquela situação.
Mas há, na perspectiva, indícios do problema do conto; "nós" somos os interlocutores dele, mesmo que até a ação principal, como se vê pela abertura, não havia mais ninguém vivo naquele estado inteiro, ou em todo país, sendo otimista.
Quando o menino vê outra pessoa lá fora, não confia nos próprios olhos, e conta ao pai; e a reação dele, pelo contexto da situação, é meio esquisita (intencionalmente). E, de novo, essas perguntas vão surgindo e nos mantém lendo.
A sequência final, entretanto… é broxante e anticlimática. A única explicação possível, a meu ver — até aí a narrativa estava sendo muito bem conduzida, — é que o Leiber se cansou do conceito e quis acabar logo; não quis desenvolver mais nada.
Sem alerta de spoiler mesmo porque acho que ninguém vai ler uma história tão nichada: não era paranoia do menino, eram mesmo pessoas. Elas se revelam interessadas por como aquela gente conseguiu viver dentro de um buraco, com baldes de oxigênio... e revelam haver diversos redutos de humanidade pelo mundo. Há até uma pitada de desenvolvimento de personagem na relação dos visitantes com o menino mas... subitamente o conto acaba. A conclusa acaba sendo: mesmo a terra solapada forçadamente do sistema solar, mesmo com tudo congelado, a humanidade ainda dá seu jeititinho de ir vivendo. Isso sou eu extrapolando o fim, que consegue ser mais abrupto que isso.
É uma das piores conclusões de conto que li nos últimos tempos. Você, no fruir da leitura, percebe o quão estranho é, sente o baque da narrativa forçosamente interrompida. Só se salva de críticas maiores porque tudo o que vem antes é relativamente interessante e, sobretudo, não tenta de maneira alguma ser o que não é: não há enrolação ou desfiles descritivos ou longos parágrafos densos de ciência dura ou qualquer outras dessas características que cansam em certos sci-fi. Termina sendo o vislumbre de uma boa história, com um retrogosto amargo no final.
25pp
O título me pegou, não nego. Por isso parei para ler mesmo conhecendo pouco do Leiber. Nunca tinha lido nada dele e só o conhecia por meio de citações sobre a importância dele nos tropos de fantasia e por ter batizado o gênero Sword & Sorcery. Não sabia que ele também escrevia ficção científica, e nem que fosse logo ficção científica dura.
O preâmbulo meio longo é válido porque acho que essas duas facetas quase opostas (a densidade do hard sci-fi e as vibrantes histórias de aventura e feitiçaria) estão levemente presentes aqui. E o maior problema não vem da tentativa de conciliar isso, mas sim da forma frouxa que ele dá ao conto.
Antes de chegar aí, porém, ele consegue te segurar na narrativa, sabe contá-la muito bem. A abertura é forte, ao molde daquela famosa historinha "Não há ninguém no mundo. Batem a porta" só que expandida. Começa em primeira pessoa e a exposição acontece aos poucos:
"Vou te falar, eu até pensei, na hora, que fosse uma jovem. Sim, o rosto bonito de uma jovem, iluminado por algo e olhando diretamente para mim. Do quinto andar do apartamento do outro lado da rua. Mais ou menos na mesma altura onde se formou o cobertor branco de ar congelado. Nunca vi uma menina da minha idade antes, exceto nas velhas revista que encontro por aí — minha irmã ainda é uma criança, e minha mãe uma idosa, bastante doente e miserável — por essas razões o susto que levei foi tão grande que o balde de oxigênio foi ao chão. Quem não se assustaria, sabendo que não há mais ninguém vivo na terra além de nossa família e você, ao ver outra pessoa por aí?"
Algum corpo estranho gigantesco passou pelo nosso sistema solar e arrastou a terra para longe do sol (The Big Jerk, chamam), o que faz a atmosfera congelar instantaneamente. Se entendi bem: os diferentes compostos, por conta das diferenças na constituição, congelam de maneira diversa e em camadas diferentes. O pai do protagonista consegue montar um ninho, que é como chamam o buraco de poucos metros quadrados, chapado por paredes grossas e alumínio e outras coisas, onde conseguem sobreviver buscando na parte de cima baldes de oxigênio congelado. Daí o título, sim.
Vestem uma roupa de astronauta improvisada, vão à superfície, buscam o oxigênio congelado, colocam-no perto da fogueira para derreter, e por conta da parede e outras coisas, o oxigênio é retido ali o máximo possível. Antes do balde descongelar, busca-se outro, e assim vão vivendo.
Falando assim parece tedioso, mas não é. Um mundo congelado é um mundo morto, parado, estático? Na visão do autor, não. Justamente por conta da composição de tudo que nos cerca. A dose ação/descrição/construção de mundo é bem administrada, e o ponto de vista do protagonista, quase uma adolescente, é leve e fácil de acompanhar, apesar do conteúdo. É ele quem vai nos contando tudo daquele mundo, afinal já nasceu naquela situação.
Mas há, na perspectiva, indícios do problema do conto; "nós" somos os interlocutores dele, mesmo que até a ação principal, como se vê pela abertura, não havia mais ninguém vivo naquele estado inteiro, ou em todo país, sendo otimista.
Quando o menino vê outra pessoa lá fora, não confia nos próprios olhos, e conta ao pai; e a reação dele, pelo contexto da situação, é meio esquisita (intencionalmente). E, de novo, essas perguntas vão surgindo e nos mantém lendo.
A sequência final, entretanto… é broxante e anticlimática. A única explicação possível, a meu ver — até aí a narrativa estava sendo muito bem conduzida, — é que o Leiber se cansou do conceito e quis acabar logo; não quis desenvolver mais nada.
Sem alerta de spoiler mesmo porque acho que ninguém vai ler uma história tão nichada: não era paranoia do menino, eram mesmo pessoas. Elas se revelam interessadas por como aquela gente conseguiu viver dentro de um buraco, com baldes de oxigênio... e revelam haver diversos redutos de humanidade pelo mundo. Há até uma pitada de desenvolvimento de personagem na relação dos visitantes com o menino mas... subitamente o conto acaba. A conclusa acaba sendo: mesmo a terra solapada forçadamente do sistema solar, mesmo com tudo congelado, a humanidade ainda dá seu jeititinho de ir vivendo. Isso sou eu extrapolando o fim, que consegue ser mais abrupto que isso.
É uma das piores conclusões de conto que li nos últimos tempos. Você, no fruir da leitura, percebe o quão estranho é, sente o baque da narrativa forçosamente interrompida. Só se salva de críticas maiores porque tudo o que vem antes é relativamente interessante e, sobretudo, não tenta de maneira alguma ser o que não é: não há enrolação ou desfiles descritivos ou longos parágrafos densos de ciência dura ou qualquer outras dessas características que cansam em certos sci-fi. Termina sendo o vislumbre de uma boa história, com um retrogosto amargo no final.
Original em Inglês [Trad. Livre minha]
Conto de Ficção Científica
✲ 3.0/5.0