A review by joanaff17
A Livraria dos Finais Felizes by Katarina Bivald, Margarida Filipe

4.0

E já que estava numa de ler livros sobre livros, pedi à Eva que me emprestasse este também. Que uma livraria faz muito por finais felizes, já eu sei, mas fiquei intrigada com o que estaria no interior deste livro quando me apercebi que se tratava de outra história dedicada ao amor à leitura. Vamos a isto.
Imaginem que moram na Suécia, onde trabalham numa livraria. A propósito de uma venda online, começam a trocar cartas com uma senhora de idade que mora nos EUA, mais concretamente no Iowa. As cartas, que começam por ser acerca de um livro, multiplicam-se, dando espaço a que se troquem várias impressões sobre as vidas que se desenrolam, cada uma de um lado do Atlântico. Estabelece-se uma amizade, gera-se um convite.
Sara é uma jovem com poucas aspirações além da leitura. Gosta do seu emprego na livraria e, ao contrário das outras jovens da sua idade, não tem histórias suas para contar. Quando se vê no desemprego, a propósito do encerramento forçado da livraria, sente-se perdida. E agora? O convite de Amy Harris, com quem parece partilhar tantos gostos literários, chega, portanto, na altura certa. Umas férias para poder descansar e ler, ler, ler, é o que lhe promete a senhora. E, por isso, Sara aceita o convite, embarca num avião e sai do outro lado do oceano.
No entanto, ao chegar a Broken Wheel, cidade de Amy, depara-se com uma grande surpresa: Amy, a sua amiga das cartas, morreu.
Ora, qualquer pessoa nesta situação insólita viraria costas e voltaria para de onde veio. No entanto, há duas coisas a considerar: Sara não tem nada melhor para fazer na Suécia e os habitantes de Broken Wheel fazem da sua principal função receberem-na o melhor que podem, em honra de Amy. Um pouco sem saber como, Sara é de imediato instalada na própria casa de Amy, enquanto, nas suas costas, os habitantes principais têm reuniões onde decidem o que fazer com ela.
É que Broken Wheel é uma cidade pequeníssima, vazia, com mais memória do que acção, onde quem ainda lá vive o faz mais porque assim quis o destino do que por qualquer outro motivo. Há uma rua principal, quatro laterais. O número de habitantes conta-se facilmente.
Por seu turno, Sara já os conhece há muito tempo, das cartas que Amy lhe escrevia, onde lhe falava dos seus amigos: Andy, o dono do bar local e primeiro homossexual assumido da cidade, Caroline, uma figura séria e beata, cheia de regras e decoro, Jen, a "jornalista" espampanante e de ideias loucas, Grace (que, na verdade, se chama Madeleine, mas que, tendo vindo de uma linhagem de Graces, se recusa a ser diferente), dona do restaurante da cidade e com um certo estilo feminista, George, um alcóolico em recuperação, John, o grande amor de Amy e único negro da cidade. E Tom.
Juntos decidem facilitar ao máximo a vida de Sara, para que ela goste da sua estadia (e porque já há muito que não tinham turistas), tomando em mãos a tarefa de a fazer ficar, se possível casar e tudo. Sara sente-se tão abafada em cuidados e atenções que sente que precisa de retribuir. E, depois de ver todas as suas tentativas frustradas, decide pegar nos livros de Amy e abrir uma livraria, para os estimular a ler. Com isso, Sara acaba por modificar de tal forma a dinâmica da cidade (com a livraria começam a chegar turistas vindos das cidades contíguas), que todos percebem que Sara traz em si o fôlego que faltava àquele lugar árido e esquecido. Para eles é também um mistério todo aquele amor por livros (há até uma cena em que se vão acumulando transeuntes junto à montra da livraria, só para ver Sara ler horas a fio, sem levantar a cabeça). Sara, por sua vez, sente que pertence a um lugar, o que é novidade por si só.
Sendo um livro sobre livros, é engraçado verificar as semelhanças com outras obras literárias. Estou a pensar, por exemplo, em Chocolate, de Joanne Harris (uma mulher que chega a uma cidade pequena e de brandos costumes e, com a sua determinação, cria um epicentro de diferença que vai atraindo os restantes para fora dos seus hábitos e ideias pré-concebidas; esta semelhança torna-se ainda mais evidente se considerarmos o arco de personagem de Caroline, que aqui seria o equivalente ao Monsieur "Le Comte", ou à própria Caroline Clairmont, ambos de Chocolate) ou em Orgulho e Preconceito, de Jane Austen (sendo que o Mr Darcy aqui é Tom, sobrinho de Amy, com quem Sara começa por ter uma relação estranha e fria).
O resto deixo para quem quiser ler. Direi apenas que é um livro que agarra o leitor e o faz querer saber o que acontece a seguir. É uma história agradável que se segue com leveza e curiosidade, e que nos vai fazendo sorrir, aqui e ali, pelas semelhanças e até referências a outras obras literárias.
Gostei bastante e recomendo.