A review by acrisalves
The New Voices of Fantasy by Eugene Fisher, Brooke Bolander

5.0

Publicado aqui https://osrascunhos.com/2017/07/12/the-new-voices-of-fantasy-varios-autores/

O mercado anglo-saxónico de ficção especulativa vai-se renovando, seguindo novas tendências, estilos e culturas, gerando cruzamentos impensáveis entre géneros em contos que reflectem as preocupações do seu próprio tempo. Ao longo dos anos vão surgindo novos autores que começam a ser conhecidos pelos contos destacados por prémios ou em antologias de melhores do ano. Este volume pretende reunir algumas histórias destes novos autores e destacá-los como promissores para os próximos tempos.

A antologia começa com um conto de Alyssa Wong, a quarta história publicada da autora, com a qual venceu o Nebula e o World Fantasy Award (a mesma história que foi, também, nomeada para um Shirley Jackson, um Bram Stoker e um Locus Award). Claro que prémios e nomeações não são garantia de boas histórias, mas este conto, Hungry Daughters of Starving Mothers contém detalhes de horror e fantástico num cenário actual onde a corrupção alastra, resultado do consumo imediato e da fome interminável.

Selkie stories are for losers é a história seguinte da autoria de Sofia Samatar, uma autora que não é propriamente uma voz emergente, antes uma autora já reconhecida no género com histórias como A Stranger in Olondria que venceu vários prémios. Cruzando lendas diversas sobre mulheres que se mantém entre os humanos até ao momento em que alguém encontra a sua antiga pele (ou descobre que são algo mais do que parecem), esta história quase banal consegue surpreender pela estrutura e desenvolvimento.

Depois de tornados apaixonados por raparigas (em Tornado’s Siren de Brooke Bolander que apenas possui como elemento distintivo o tornado capaz de sentimento) encontramos Left the century to sit unmoved de Sarah Pinsker que nos traz um fenómeno local, um lago que faz desaparecer totalmente algumas pessoas sem critério específico – mesmo depois de drenado o lago apenas se encontram os objectos e roupas da pessoa.

Max Gladstone também não é propriamente um autor desconhecido, escrevendo sobretudo fantasia urbana. Em A Kiss With Teeth não foge ao género mas apresenta uma das melhores histórias do conjunto, com um tom levemente cómico sobre as preocupações de um pai que vê o seu filho ter más notas. Como pai tenta perceber o que se passa, mas a sua própria natureza torna difícil ajudar sem dicas da professora, a presa perfeita. Ah. É que o pai é um vampiro reformado que tenta passar por humano, simulando os nosso gestos e forma de andar.

Em The Cartographer Wasps and the Anarchist Bees de E. Lily Yu explora-se uma premissa que não é totalmente nova. Recordo que em The Bees de Laline Paull já se apresentava a vida numa colmeia apresentando aspectos sociais da hierarquia e como esta poderia ser subvertida por um único elemento. Confrontando as abelhas com as vespas possuidoras de uma tecnologia mais avançada este conto de E. Lily Yu consegue ser um relato apaixonante sem necessitar de se centrar num único elemento, e comparar vários sistemas de sociedade.

A. C. Wise traz-nos outro dos melhores contos do conjunto, um guia cómico de como a bruxa pode arranjar uma casa. Começando com as formas aborrecidas como aquisição e ocupação, passa por nos apresentar como se pode domar uma casa ou fazer crescer uma, expressando para cada método os cuidados a ter (os humanos podem não gostar muito de ter uma bruxa dentro de casa e podem tentar queimá-la, por exemplo, ou a casa pode pregar partidas a quem a tenta influenciar).

Depois de Hauting o Apollo A7LB (um conto que já conhecia da excelente colectânea do autor Hannu Rajaniemi), segue-se uma história irónica de Chris Tarry, Here be dragons, onde dois homens simulam a existência de dragões para extorquírem dinheiro das vilas mostrando depois entranhas de vários animais como prova de uma chacina. Um dia esta trapaça pode voltar-se contra os supostos salvadores – de mais formas do que o leitor imagina.

Mais juvenil, mas enternecedora pela forma inocente e desiludida como nos apresenta o amor de um pato por uma rocha, The Duck de Ben Loory é um dos contos que vale a pena ler, nem que seja para ver a forma como transforma este premissa simples e aparentemente idiota numa boa história.

Publicado no The New Yorker, The Philosophers de Adam Ehrlich Sachs traz uma história demente de problemas genéticos hereditários que supostamente não trariam problemas psicológicos. Geração após geração, os homens desta família perdem na idade adulta todos os movimentos e passam a comunicar com os restantes recorrendo ao piscar de olhos com o intuito de transmitir as próximas palavras do seu livro. Arrepiante, claustrofóbico e assustador pela degradação, é um bom conto que vai elevando a premissa ao extremo absurdo .

Esta colectânea termina com uma novela mais longa, The Pauper Prince and the Eucalyptus Jinn, de Usman T. Malik, que se centra na problemática da emigração e da integração cultural sob uma fábula contada pelo avô (talvez demente) que recorda interacções com princesas e génios e que foi mudando de país em país até atingir determinados objectivos. Demonstrando como existe sempre muito para revelar da vida dos nossos antepassados, segredos dolorosos que ficaram enterrados, feitos que se silenciaram pelas circunstâncias, esta é uma novela excelente.

Ainda que não tenha apreciado todos os contos de igual forma, até porque os estilos e géneros são muito diversos, esta colectânea possui uma qualidade narrativa bastante elevada. Nem todas as histórias apresentam elementos que se destaquem pela originalidade, mas todos se encontram bem escritos e estruturados. São, na sua maioria, contos que possuem o necessário para envolver, mas sem excesso de detalhes que quebrem o ritmo ou desbalanceiem a história. Para os interessados em se actualizar para o que tem sido publicado recentemente, eis uma boa aposta.

(esta colectânea foi fornecida pela editora via NetGalley)